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14 de outubro de 2012

9 de outubro de 2012


Dois Barcos


A verdade... A verdade é que eu não sou como as outras pessoas. Nem elas são iguais entre si.
Apesar disso, eu sou ainda mais diferente. Eu penso. Não só penso, como penso BEM, às vezes até duas ou três vezes antes de falar. Mais do que o necessário, é claro. Entretanto, eu sou ' de lua' e como se a lua minguante trocasse com a cheia, lá ia eu agindo como uma bomba prestes a explodir: impulsiva, braba, paranóica, divertida, corajosa, cheia de vida. Não que tudo isso faltasse a outra lua, não é isso. Cada lua se completa, assim como cada estrela tem ligação com a outra, formando, no fim, um sistema solar.
Enfim, comecei a divagar aqui sem chegar ao ponto de partida.

A minha cruel verdade é que eu fiz, inconscientemente, quando tinha apenas 5 anos, a maior burrada da minha vida. Idealizei um pai que não era meu, e que nunca seria meu, pois ele não existe e nunca existirá. O pai que eu criei ainda pequena, era um pai -estilo herói-, um príncipe de um reino perdido e encantado. Com o passar dos anos isso mudou, mas a "essência" não se perdeu. Eu continuei a procurar no meu pai real, o pai idealizado, herói. Pensando bem, eu agi como os poetas na época do Romantismo: idealizei, troquei a paisagem e fui de encontro com o mais longe possível da realidade. E, quando, aos 6 anos de idade, fui, finalmente, apresentada ao meu "real' pai, o meu pai idealizado e perfeito entrou em choque. Por mais que ele não tivesse passado de uma fantasia de criança, a idealização continuou e foi cada vez mais, batendo de frente com o pai que estava ali na minha frente. Era um homem comum, com seus hábitos adquiridos ao longo da vida, suas qualidades e seus defeitos. Era um homem comum, numa luta contra o homem perfeito. Contra um homem, que apesar de ter os seus defeitos, sabia reconhecê-los, contorná-los. Um homem que sabia ser pai, e melhor do que isso! Sabia ser o melhor pai do mundo, mesmo que errasse de vez em quando. Sabe aquela frase mágica que praticamente todos os pais dizem às suas princesinhas? Aquela 'vamos combinar uma coisa: você só irá sair com um rapaz lá pelos 30 anos,... ou melhor, lá pelos 40...'.
Eu semprei esperei que o meu pai fosse dizer algo do tipo para mim, aliás espero até hoje. Para mim, essa frase que mostra mais o ciúme e o medo de ver a filha crescer, é a maior demonstração de amor que uma filha pode receber. Não é apenas cíume e medo, nessa curta frase há todo um significado por trás: AMOR.
Apesar de todo o meu ressentimento e carência, o meu sofrimento não pode ser ligado à rejeição. Nunca, em momento algum, houve rejeição pela parte de meu pai. Meu pai aprendeu a me amar, assim como aprendeu também que filhas caçulas são sempre as mais ariscas. Se tem em algo que eu acredito é que ele me ama. Mas, antes de me amar, ele ama o seu umbigo. Mais do que o certo a se fazer, não é mesmo? O problema, é que ele se ama ALÉM DO NECESSÁRIO. Ou talvez, eu esteja confundindo esse "amor-próprio-exagerado" com um ódio exagerado de si mesmo. Enfim, o que entra em conflito na nossa "não-relação" é a minha mentalidade arisca e cansada de ceder com a mentalidade exageradamente egoísta e rústica de meu pai. É bem verdade que eu sou mimada, egoísta e arisca. Mas, é mais verdade ainda dizer que "eu tenho a quem puxar".
Minha idealização; o pai herói que eu criei um dia, se foi, assim como o sol se põe. E, quando amanheceu, quem estava lá de pé, sozinho, era o meu pai real, careca, cansado, cheio de manias e modos. Quando eu finalmente soube diferenciar os dois, passei a amar aquele homem que estava ali na minha frente. Era um homem que, do seu modo torto, estava tentando ser um pai. Se ele conseguia ou não, isso era mero detalhe, para mim bastava que ele tentasse. O problema é que assim como o tempo move colinas, ele também nos dá a habilidade da visão, do tato, e da sabedoria. Em contrapartida, o cansaço, o envelhecimento e a teimosia vem junto, mantendo o equílibrio básico da vida. Embora, todos esses "sintomas" tenham me atingido de alguma forma -uns mais, outros menos-, o que mais teve destaque foi o do cansaço. Todos dirão: "nossa, você é muito nova para estar cansada, vai se mexer, vai trabalhar, fazer algo da vida vai acabar com essa frescura" e eu responderei " e você? o que te importa a minha vida pra ti? ela não passa de um acaso do destino-quem sabe um tropeço ou um mero 'oi, tudo bem?-, pois lhe digo agora, minha amiga, doa a quem doer, só quem vive sabe o que é dor, felicidade e amor! e as vivencia com um gosto que você, minha cara, nunca saberá qual é, pois lhe falta a emoção da vida!".
Com o cansaço, ceder e fingir(habilidades que as pessoas adquirem e as mantém no modo automático) torna-se impossível. A minha não-relação com o pai exigia essas habilidades, assim como exigia
de mim a capacidade de mantê-las. E, assim foi. O cansaço, ao invés de melhorar, piorou, ao compasso da minha não-relação entrar em um estado de convivência cada vez maior. O cansaço, acumulado com a convivência daquele que exigia algo do qual eu não estava mais apta, levou-me à explosão. Igual à uma bomba-relógio, eu entrei em colapso e tomei a única atitude que sempre evitei tomar: cortar as ervas-daninhas. Cansei. A verdade é que os esforços de meu pai em ser UM PAI foram poucos, e juntamente com seus falsos moralismos(como exaltar a humildade andando nos melhores-e mais caros- carros e restaurantes), assim com as suas pretensões de mauricinho(numa retórica crise de meia idade) e de "suas filhas devem sofrer na mesma moeda", levaram-me a uma atitude radical, e talvez permanente: cortar relações.  Se um dia eu voltarei ou não a falar com o meu pai, eu não sei. Mas, a mais cruel de todas as verdades é que a sensação que tenho, agora, sem a minha não-relação, é a de LIBERDADE. Liberdade, sossego, felicidade. Se é o certo ou não, não se sabe e seguirá assim, até que a última carta seja dada e eu seja tão velha quanto meu pai é hoje. Minha relação com meu pai sempre será a não-relação, isso é um fato. Não-relação, já que não merece o nome autêntico, pois há a falta do mesmo, fazendo com que a relação se mantenha por causa do esforço de apenas um dos lados. O provérbio que mais marca essa fase e vida-ou vidinha simplória- da maioria das pessoas é este: "Pimenta nos olhos dos outros, é refresco".

Allons-y, Kate.